16
mai
2012
Um terço do trigo deve ser rebaixado

Cerca de 35% do trigo que está sendo plantado no Paraná deve ser rebaixado na hora da comercialização. Com a mudança do padrão do grão determinada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), 1/3 do produto colhido no estado será vendido com uma classificação diferente dos anos anteriores, conforme avaliação dos dados das cooperativas.

A instrução normativa do Mapa que entra em vigor em julho amplia de três para quatro os grupos de classificação (veja quadro abaixo). As propriedades do trigo melhorador e pão ficam mais rígidas e o que era trigo brando agora se divide em trigo doméstico e básico. A linha de corte para o trigo sem classificação passa de 50 para 100 pontos de força de glúten.

A projeção é que o Paraná produza 2,2 milhões de toneladas de trigo neste ano. Deste montante, cerca de 770 mil toneladas devem ser enquadradas em uma classe mais baixa do que era na safra passada, conforme o Sindicato e Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar).

No ano passado, 90% do volume colhido no Paraná foram vendidos como trigo melhorador ou pão. Essas classificações são destinadas à panificação, que representa mais de 50% do mercado de farinha de trigo no Brasil. Com os critérios que entram em vigor em julho, apenas 60% devem atender essa demanda.

Uma outra parcela também será rebaixada. Trata-se da porção de 5% da colheita que eram classificados como trigo brando, usado para produção de bolachas e biscoitos, e agora estarão abaixo da linha de corte. O produto tende a ser misturado ou destinado para ração animal.

“O problema será atender a esta demanda quando o clima não ajudar e a qualidade do trigo diminuir”, afirma Flávio Turra, gerente técnico e econômico da Ocepar. Ele explica que, quando a safra for prejudicada, o mercado vai depender da importação. Turra avalia que o produtor está ciente das mudanças e vai fazer o possível para se adaptar.

Os novos critérios não são novidade para a indústria, afirma Marcelo Vosnika, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo). “Ao invés de quantidade, o produtor vai investir em qualidade.” O setor espera que o produtor nacional passe a fornecer o trigo de padrão buscado no exterior. “A exigência de qualidade vem do consumidor”, sustenta Vosnika.

Para entrar em leilões públicos, o trigo terá de atender aos novos padrões. Com isso, o governo quer evitar formação de estoques de produto de baixa qualidade.

A mudança não deve livrar o Brasil da dependência das importações, que representam metade do consumo de 11 milhões de toneladas. A medida deve solucionar apenas problemas pontuais relacionados à remuneração dos triticultores e à qualidade da farinha da indústria local, avalia Steve Cachia, analista do mercado de commodities da Cerealpar.

Também em julho, vigoram novos preços mínimos, com reajustes de 2% a 5%. A remuneração será maior, mas os investimentos necessários para os padrões mínimos também. O trigo brando, que passa a ser doméstico e básico, tende a valer inclusive menos a partir da próxima colheita.

Safra depende de aumento na produtividade

O Paraná terá de elevar em 20% a produtividade do trigo para alcançar a produção estimada em 2,26 milhões de toneladas na projeção do Departamento de Economia Rural (Deral). Isso porque a área foi reduzida em 26%, para 785 mil hectares, extensão próxima da cultivada em 2000. Nos últimos 11 anos, as lavouras foram maiores.

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) prevê produção de 2,12 milhões de toneladas no estado. Mesmo neste caso, seria necessário um rendimento 12% maior que o de 2011 por hectare. Conab e Deral estimam a área plantada em 785 mil hectares.

Resistente à geada na fase inicial e à redução de chuva característica do inverno, o trigo perde qualidade quando enfrenta umidade ou geada tardia. No ano passado, a produtividade teria ficado entre 2,4 mil e 2,5 mil quilos por hectare no Paraná. Os levantamentos oficiais estão contando com redimento próximo do verificado em 2010, um dos maiores já registrados no estado.

No Rio Grande do Sul, o quadro é inverso. Houve aumento de 10% na área (2011 para 2012), que atingiu 1 milhão de hectares, mas as previsões são de queda na produtividade: de 2,9 mil para 2,4 mil quilos por hectare.

Com a redução na produção, a falta de liquidez deve ser um problema mais breve do que o enfrentado nos últimos anos. No entanto, não há garantia de que os triticultores, mesmo depois da redução de área, tenham mercado. O setor depende da oferta de produto na Argentina e das cotações internacionais. Os moinhos devem repetir a estratégia de formar estoques antes da entrada da safra brasileira.

Exigências diminuem o interesse pelo plantio de trigo

O trigo não empolgou os produtores do Paraná nesta safra e, com os novos padrões, o setor mostra-se mais retraído do que reanimado. Mesmo quem aposta em alta tecnologia adota uma postura contida.

O triticultor Bauke Djiks­­­tra, referência em produtividade em Carambeí, na região de Ponta Grossa, está em busca de variedades que apresentam maior força de glúten, mas fala em reduzir a área plantada. “Vou plan­­­tar 220 hectares, um pouco menos do que no ano passado. É uma cultura difícil. Tem que investir muito para ganhar pouco.”

Ele estima que a produção fique em 480 toneladas, se as condições climáticas colaborarem. “Eu negociei a última safra com um preço de R$ 0,48 o quilo. Isso é praticamente metade do preço da soja. Não acredito que a renda aumente mesmo para quem produzir um trigo melhor.”

Segundo Bauke Djikstra, outras culturas de inverno como a cevada e a aveia branca não podem ser consideradas boas alternativas “Nos dois casos, a relação de dependência com o preço do trigo é muito grande. Dá no mesmo”, reforça.

O produtor Manoel Henri­­que Pereira tem a mesma opinião. Ele planta trigo há cerca de 50 anos e afirma que, mesmo depois de tanto tempo de experiência, não é bem remunerado. Nonô Pereira pretende plantar 500 hectares na propriedade que cultiva em Palmeira, também nos Campos Gerais.

“Essas mudanças [nas exigências de padrão] só vão reduzir ainda mais o interesse pelo trigo. Eu estou mais para “tristecultor” do que para triticultor”, avalia. Ele também não aposta em melhores preços. “Planto apenas para cobrir o solo. Não chega a ser uma lavoura de resultados.”

Fonte: Gazeta do Povo - Caminhos do Campo

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