23
fev
2016
Trigo caro e queda no consumo apertam margens de moinhos brasileiros

O aumento do custo do trigo e uma redução no consumo de massas e biscoitos têm apertado as margens dos moinhos brasileiros, que em alguns casos estão negativas em meio a um cenário de alta do dólar, maior necessidade de importações do cereal, eletricidade mais cara e menor poder de compra dos consumidores domésticos.

"O cenário atual é de grande aumento nos custos dos moinhos e quase nenhum aumento nos preços das farinhas. É propício para quebrar o setor, se ele não se reinventar", disse o diretor da consultoria Trigo & Farinhas, Luiz Carlos Pacheco.

Segundo ele, o prejuízo entre a produção e a comercialização de farinha comum poderia chegar, por exemplo, a 20 por cento atualmente, dependendo da unidade e da região.

A farinha comum é usada por indústrias para a produção de biscoitos e massas, produtos que são retirados mais facilmente da lista de compras dos consumidores no atual momento de inflação alta e perda do poder aquisitivo da população. As vendas desses produtos caíram mais de 50 por cento nos últimos dez meses, em função da crise econômica, citou Pacheco.

A situação também é apertada na produção de trigo para panificação, mesmo com o aumento de custos podendo ser repassado mais facilmente aos consumidores, que abrem mão do hábito de comer pão apenas em último caso.

Na semana passada, o preço do "trigo pão" subiu 0,44 por cento, ante uma retração de 1,5 por cento na farinha especial e estabilidade na farinha de panificação (dois tipos de farinha usada nas padarias).

"Existe queda de consumo, e o custo está subindo... As margens tendem as ser menores", disse à Reuters o executivo de um moinho em São Paulo.

CUSTOS

Se o consumo limita a receita dos moinhos, elevações nos preços do trigo e em custos, como o da eletricidade, elevam substancialmente as despesas das empresas.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, as indústrias estão comprando praticamente o que irão moer no mês, sem formar estoques, relatou o corretor especializado em trigo João Vargas, da corretora Agrisoy, de Porto Alegre.

"Os moinhos vendem a farinha e aí vão atrás do trigo", contou ele. "Tenho vários lotes de trigo aqui e não estou conseguindo colocar no mercado."

Em 2015, o Brasil colheu 5,5 milhões de toneladas de trigo, segundo a Conab, e precisou importar 5,75 milhões de toneladas.

Esse movimento habitual de compras externas, em conjunção com uma alta de 48,5 por cento no câmbio no ano passado, ajudou a catapultar os custos das indústrias nos últimos meses.

Os preços do trigo no oeste do Paraná, por exemplo, acumulam alta de cerca de 30 por cento nos últimos 12 meses, segundo dados do Cepea.

"Tudo é dolarizado, a importação baliza o mercado interno", lembrou o executivo do moinho, que pediu para não ser identificado.

Nos próximos meses, com o consumo gradual do estoque do trigo colhido em 2015, as importações deverão se acelerar.

O problema se agrava porque a qualidade da safra passada foi muito ruim e o Brasil precisará importar grandes quantidades de trigo com alto padrão, necessário para fabricação de farinha para panificação. Contudo, os problemas climáticos que afetaram o Sul do Brasil também prejudicaram a colheita na Argentina, que costuma ser o principal fornecedor de trigo do Brasil.

"O que eles (argentinos) estão exportando até agora para fora do Mercosul é apenas para ração animal, então o trigo de qualidade terá que vir dos EUA, que tem um custo logístico e tarifário maior para o Brasil", projetou Pacheco.

Moinhos também estão com as margens apertadas pelo preço da eletricidade necessária para movimentar as máquinas.

Segundo pesquisa do Banco Central, os preços da energia subiram 52,3 por cento em 2015.

As dificuldades devem se converter em saída de algumas empresas ou paralisação de unidades industriais.

A Trigo & Farinhas projeta, por exemplo, que a moagem no Rio Grande do Sul, maior Estado produtor de farinhas industriais no país, deverá cair para 1 milhão de toneladas em 2016, ante 1,2 milhão em 2015 e 1,5 milhão em 2014, quando os moinhos gaúchos operaram dentro da capacidade máxima instalada.

Procurada, a Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo) não se pronunciou sobre o assunto.

 

Fonte: Reuters
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