A Bolsa de Comércio Rosário publicou na última semana um estudo sobre a expansão da produção brasileira de trigo que mostra um quadro pouco conhecido no próprio Brasil. O diagnóstico é que o cereal argentino perde espaço no mercado brasileiro, seu principal reduto externo, diante da expansão da produção do Paraná, que passou a ser vendida em volume sem precedentes para as regiões Sudeste e Nordeste. Essa mudança ocorreu no último ano, com apoio de Brasília para redução do custo do transporte marítimo a partir do Porto de Paranaguá em direção aos portos nordestinos.
Assinado pelo consultor brasileiro Luiz Carlos Pacheco, da Trigo & Farinhas, o estudo mostra o potencial de expansão da produção e a qualidade da safra paranaense, o que permite ao estado ampliar sua participação no mercado interno em condição de igualdade frente Argentina, Estados Unidos ou Canadá. "O Paraná tem um trigo semelhante ao argentino e ao norte-americano, que pode atender a indústria de pães e massas especiais", afirma Pacheco.
Na prática, a Argentina levantou uma pergunta cuja resposta deveria estar na ponta da língua da triticultura brasileira: "Quais as condições reais de o Brasil aumentar sua produção e, finalmente, chegar à autossuficiência? "
Segundo Pacheco, a necessidade de importação - de 6,7 milhões de t, ante uma produção de 5,9 milhões de t ao ano -não será eliminada, mas tende a ser reduzida a partir do canal aberto pelas remessas de trigo do Paraná ao Nordeste verificadas no último ano. Por outro lado, o Brasil ainda não tem um sistema de seguro eficiente e isso pode provocar frustrações no setor produtivo e solavancos na intenção de plantio. Em sua avaliação, nesta temporada, o país tende a repetir a área plantada de 2014 - 2,7 milhões de hectares, que prometia mais de 7 milhões de toneladas, mas acabou rendendo 5,9 milhões. "Desta vez, a produtividade pode chegar ao que se esperava", ressalva.
Além das barreiras internas, que incluem a competição do trigo com o milho de inverno, a expansão da produção brasileira se depara com as vantagens dos competidores do exterior. O pagamento do trigo importado pode ser feito em um ano, enquanto o nacional tem de ser quitado em 35 dias, compara o estudo da Bolsa de Rosário. Os juros brasileiros para financiamento da compra e venda, de 6,5% ao ano, estão bem acima dos praticados nos Estados Unidos e Europa, abaixo de 1% ao ano. Outra desvantagem é a própria qualidade do trigo brasileiro, que varia bem mais que a do importado. Isso sem contar os problemas logísticos: produção concentrada no Sul, alto custo da cabotagem, distâncias longas demais para o transporte rodoviário.
1,3 milhão de toneladas de trigo. Este foi o excedente da safra colhida em 2014 no Paraná. O estado produziu 3,7 milhões e, com capacidade para processar 2,4 milhões de toneladas, buscou apoio de programas públicos para remeter mais grãos ao mercado de consumo do Nordeste. Para continuar dominando esse espaço, vai depender de produção estável e subsídio também em 2015.
US$ 49,5 a menos por tonelada foi a diferença do preço do trigo do Paraná em relação ao da Argentina no mercado do Nordeste no último mês. Essa margem representa desconto de 16,4% sobre o valor do cereal argentino (US$ 302,5), tradicionalmente mais barato. Ante o norte-americano, a vantagem é de 24%.
O risco climático é o principal fator limitante à expansão da produção de trigo no Sul brasileiro para que o país se torne autossuficiente, conforme estudo publicado na Argentina. Outras duas barreiras são consideradas decisivas: a falta de um sistema de seguro eficiente e a menor rentabilidade na comparação com o milho de inverno, que sustenta cotações lucrativas no Paraná.
Porém, o que tende a prevalecer é a comparação de preços. O trigo paranaense foi vendido a cotação 16% menor que a do argentino e 24% menor que a do norte-americano no último mês, aponta Pacheco. "Com apoio público, essa diferença pode se repetir e estimular a produção no longo prazo", resume.
Fonte: Gazeta do Povo
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