Apesar da produção recorde de 776,5 milhões de toneladas de trigo na safra 2021/2022, o último relatório do USDA, surpreendeu o mercado com uma redução de 15,5 milhões de toneladas na oferta global do cereal em função das penalizações causadas pelo clima dos principais países produtores da commodity. O destaque foi para a Rússia, onde as nevascas no início do ano congelaram as sementes e prejudicaram a lavoura que tem sido colhida nesse mês. A agência americana reduziu em 14,7% a produção total do país frente ao mês anterior, principalmente penalizado pelo trigo de inverno.
Já no continente americano, as planícies do meio-oeste dos EUA e parte do Canadá foram impactadas por secas ao longo da safra de primavera que atrasaram e prejudicaram a oferta de trigo. A somatória das perdas dos trigais dos dois países em relação à safra anterior acumula 14,7 MM de toneladas. Mesmo com as quebras, a estimativa ainda indica um ligeiro crescimento na produção, de 0,1% em relação à safra anterior. A expectativa inicial era um balanço bastante confortável em função do aumento das áreas dedicadas a cultura e com produtividades elevadas, o que não se concretizou com o andamento da safra.
Do lado da demanda, há duas safras a procura global da commodity cresce percentualmente acima da produção. Um dos fundamentos foi a maior busca do cereal como componente substituto ao milho nas rações animais, com a China sendo o principal país em função da recomposição do rebanho suíno Oavanço das cotações frente a maior procura Além da menor oferta devido às penalizações climáticas e da maior procura em função da substituição ao milho nas rações animais, criou-se um cenário de balanço mais apertado não visto desde 16/17. Com isso, os níveis de estoques finais da atual safra estão reduzindo, sendo que a soma do volume estocado dos principais exportadores totaliza 57,6 MM de toneladas, nível mais baixo das últimas 13 safras.
Com esse cenário mais apertado e acompanhado pelo aumento das cotações das outras commodities, o preço do trigo foi impulsionado ao longo dos últimos meses para níveis acima de USD 7,0/bu, patamar não praticado desde 2013. Apenas entre o início de julho e início de agosto, as cotações tiveram elevações de 10,8% no período. O mercado futuro vem precificando o cereal acima de USD 7/bu até mai/23, em função da colheita ainda acontecendo, sendo que somente a partir disso é que será possível quantificar, de fato, as perdas das lavouras causadas pelas intempéries climáticas que ocorreram no Hemisfério Norte. A produção de trigo na Argentina.
Sob o ponto de vista do maior fornecedor de trigo do Brasil, a Argentina, a semeadura dos 6,5 milhões de hectares está finalizada, área estável frente ao ano passado segundo a Bolsa de Cereales. Contudo, ainda segundo a estimativa da instituição, deve haver uma recuperação da produtividade dos trigais, somando 19 MM de toneladas nessa temporada. Vale destacar que há riscos climáticos nos próximos meses até a chegada da colheita, principalmente em função do aumento da probabilidade de formação do fenômeno La Niña, que pode reduzir os volumes de precipitação na região. Ainda nesse assunto, a maioria da cultura no campo ainda se encontra em desenvolvimento vegetativo, estágio bastante resistente à baixas temperaturas e ao menor volume de chuvas, contudo, conforme o avanço das fases no campo serão necessários volumes de chuvas maiores do que tem ocorrido no noroeste do país, o que preocupa os produtores da região. Segundo a Bolsa de Cereales cerca de 60% das lavouras argentinas estão em condição regular/seca e 39% com excesso de chuva, concentrados na região sultritícola.
Ainda é cedo para quantificar as penalizações da produção em função do clima, mas um olhar atento à esse risco deve ser primordial aos agentes compradores da matéria-prima dessa origem, visto que os contratos futuros do cereal em Rosário, por exemplo, subiram acima de 10% no último mês, indicando que os preços internacionais e a perspectiva de uma menor oferta do que a estimada deverá fundamentar as cotações em patamares mais elevados.
Além disso, não se pode desconsiderar os riscos do mercado argentino, como greves e/ou limitações de volume por parte do governo. Outro fator a se manter no radar é o baixo volume do rio Paraná, em função da falta de chuvas, como dito anteriormente. Esse panorama de menor volume, pode reduzir a velocidade de escoamento das embarcações e, consequentemente, aumentar o custo dos fretes nos portos argentinos.
E em relação a cadeia tritícola no Brasil ?
Segundo a Conab, a produção da safra de 2021 deve ser a maior da história, acumulando 8,6 milhões de toneladas, aumento de 37,6% em relação à safra passada. Esse crescimento se deu pela expansão de 15,1% da área, principalmente, nos estados do RS (23,1%) e PR (6,7%). A justificativa desse aumento de área é a melhor perspectiva de margens ao produtor e a perda da janela do plantio do milho em algumas regiões. Do lado da demanda interna, a previsão é 3,4% maior frente ao ano anterior, com o crescimento do consumo vindo a reboque das vacinações. Além disso, o destaque fica para a maior busca do trigo para a rações como substituição ao milho, que devido aos problemas climáticos, principalmente na safrinha da Região Sul, encareceram o cereal. E essa maior demanda como substituto na ração poderá diminuir o spread entre os preços de trigo de qualidade regular e o trigo de alta qualidade.
Mesmo com o aumento da demanda, a recuperação da oferta doméstica do trigo deve aliviar a relação estoque/consumo, que vem de dois anos (2019 e 2020) muito apertados. Essa situação pode levar a preços mais arrefecidos, principalmente no momento da colheita, que deve se concentrar nos dois últimos meses do ano. Além dessa produção recorde, nosso vizinho também deve alcançar uma das maiores safras já colhidas, o podendo fornecer volumes expressivos num período concentrado entre o final do ano e o início do próximo.
Vale ressaltar que mesmo nesse intervalo da ceifa da commodity, o momento de balanço mais apertado pode não arrefecer as cotações para os patamares vistos há dois anos. Outros fatores a se considerar são o câmbio e o preço dos fretes internos e marítimos que podem encarecer o custo de paridade interno. No tocante ao produtor, a procura pelo cereal deve manter o mercado aquecido tanto pela indústria moageira como pela de rações, além da oportunidade de escoar a produção para o mercado externo. A negociação antecipada com bons níveis de margens com um desses agentes pode garantir capitalização para as safras de verão, que terá custos elevados. Para a indústria local, o cenário continua desafiador visto que o repasse dos custos de aquisição da matéria-prima continua pressionando as margens da operação. O que pode dar alento a rentabilidade da indústria pode vir da receita do farelo do cereal no processo de moagem.
A fixação cambial em momentos oportunos e a compra antecipada com bons fornecedores pode favorecer a recomposição dos estoques a preços mais baixos e a manutenção de margens positivas. Como ainda há um certo tempo para o desenvolvimento da safra, pode haver alguma penalização da oferta com consequente sustentação dos preços. Sob esse ponto de vista, a fixação de parte da matéria-prima pode ser um diferencial estratégico
dados Relatório da Consultoria Agro Itaú.
Fonte: Agrolink
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