28
mar
2022
Manejo correto da buva

Além das perdas por conta da competição por recursos como luz, água e nutrientes, plantas de buva servem como hospedeiras de insetos como percevejos e lagartas, o que agrava os prejuízos em produtividade. Com capacidade vertiginosa de multiplicação e histórico de resistência a herbicidas, essa planta daninha precisa ser corretamente manejada, com a utilização em conjunto de práticas culturais e de controle químico.

Atualmente a necessidade de manejar plantas daninhas em áreas agrícolas é uma prática recorrente e importantíssima ao agricultor. Algumas espécies invasoras são comumente encontradas em campos de cultivo devido a características atreladas a sua adaptabilidade ecológica, a capacidade de se moldarem ao sistema de manejo empregado e a evolução da resistência a herbicidas. A presença de tais espécies acarretam perdas em produtividade às culturas em virtude da competição por recursos como luz, água e nutrientes e, por serem hospedeiras alternativas de pragas. Dentre as inúmeras espécies daninhas incidentes em áreas agrícolas, em especial naquelas cultivadas com soja no Brasil, a buva é considerada a mais importante devido ao seu elevado potencial competitivo e impacto sobre a produtividade da cultura. A redução da produtividade ocorre em função do número de plantas por m². Portanto, elevadas infestações podem reduzir em até 80% do rendimento da cultura da soja e, mesmo que a sua ocorrência seja baixa as perdas são significativas.

As plantas conhecidas popularmente por buva pertencem ao gênero Conyza, e podem ser de três diferentes espécies, Conyza canadensis, C. bonariensis e C. sumatrensis. No Brasil, C. bonariensis é a que apresenta maior importância agrícola, presente principalmente na região centro-sul. A buva apresenta elevada capacidade de multiplicação. Uma única planta de C. canadenses e C. bonariensis pode produzir de 200 mil sementes a mais de 800 mil sementes, respectivamente. Estas sementes são leves e apresentam “papus”, estrutura que permite sua disseminação pelo vento a longas distância. Essa característica possibilita sua presença nos mais diversos cultivos, como milho, trigo, algodão, frutíferas e pastagens. É importante ressaltar que plantas de buva são frequentemente encontradas em áreas marginais, como encostas, beira de estradas, áreas abandonadas, entre outros. Permitindo, deste modo, a sua multiplicação e reinfestações futuras em áreas cultivadas próximas.

O manejo de Conyza spp. foi realizado até pouco tempo, em especial na cultura da soja transgênica (RR), com o herbicida glifosato. Após muitos anos utilizando-se constantemente esta molécula, mais de uma vez no ciclo da cultura, a evolução da resistência ocorreu de forma generalizada, inviabilizando o uso desse herbicida no manejo de Conyza spp. No Brasil os primeiros casos de resistência ao glifosato foram identificados em 2007 para as espécies C. bonariensis e C. canadensis. Já em meados de 2010, o primeiro caso de resistência ao glifosato foi relatado para C. sumatrensis. A resistência é resultado do uso contínuo de um mesmo herbicida ou de herbicidas diferentes, com mesmo mecanismo de ação. Essa prática seleciona plantas naturalmente resistentes, que sobrevivem e produzem sementes,  o que culmina no aumento em frequência da resistência em áreas agrícolas. A partir da ocorrência da resistência ao glifosato, outros herbicidas passaram a ser utilizados para o controle desta invasora, como o chlorimuron-ethyl, que é um produto com mecanismo de ação diferente do glifosato. Novamente, o uso contínuo e de forma isolada deste herbicida proporcionou a evolução à resistência, sendo encontrados no ano de 2011 biótipos de C. sumatrensis com resistência múltipla aos herbicidas glifosato e chlorimuron-ethyl. Os relatos de casos com resistência múltipla estreitam o espectro de herbicidas disponíveis para o controle de Conyza e, que não causem fitointoxicação na cultura de interesse econômico.

 

Em diferentes regiões do mundo já foram confirmados casos de resistência de Conyza spp.  a herbicidas com os mecanismos de ação: inibidores do fotossistema II (atrazina, simazina, diuron e linuron), inibidores do fotossistema I (paraquat e diquat), inibidores da enzima ALS (chlorsulfuron, imazapyr, cloransulam-methyl e chlorimuron-ethyl) e inibidores da enzima EPSPs (glifosato). Da mesma forma, confirmaram-se casos de resistência múltipla: inibidores da enzima EPSPs + inibidores do fotossistema I, inibidores da enzima ALS + inibidores do fotossistema II, e inibidores da EPSPs + inibidores da ALS. Este cenário alerta para a elevada variabilidade genética das populações de buva e do potencial evolutivo da resistência múltipla a herbicidas, pois engloba praticamente todos os mecanismos de ação utilizados no Brasil para seu controle. Neste contexto, é imprescindível o correto uso destes herbicidas, respeitando doses, sucessões e estádios das plantas aspergidas, de modo a evitar a perda por completa, em um futuro próximo, da eficiência desses produtos.

O controle da buva deve ser realizado de forma integrada, utilizando métodos culturais em concomitância ao químico. A presença de densas camadas de palhada (mais de 4 ton/ha), a partir de culturas ou coberturas de inverno, proporciona redução drástica na capacidade de germinação e emergência dessa daninha. Essa redução ocorre porque a buva apresenta germinação fotoblástica positiva, ou seja, precisa de luz para germinar. As pequenas sementes da Conyza sob densas camadas de palha não recebem o estímulo luminoso para a germinação e, portanto, não há o estabelecimento na área. A viabilidade das sementes ainda tende a diminuir em função do tempo que permanecem no solo, além de aumentar a possibilidade da ação de microrganismos que as destroem, diminuindo o banco de sementes no solo e reinfestações futuras.

O efeito físico da palhada sobre o solo de forma isolada dificulta a emergência das plântulas, exigindo uma maior demanda energética para que atinjam a superfície, comecem o processo fotossintético e se estabeleçam. Durante este período, muitas sementes com baixo vigor não conseguem emergir, diminuindo a incidência de buva na área. De forma complementar, plantas que conseguem ultrapassar a camada de palha, apresentam desenvolvimento lento e menos vigoroso, facilitando o controle químico. Culturas de inverno como, trigo e aveia, além de serem uma fonte de renda, proporcionam a obtenção de uma densa camada de palha que acarreta redução de mais de 90% no número de plantas infestantes na área. Ervilhaca e nabo forrageiro também têm se mostrado como excelentes formadores de palhada na redução da emergência de buva. 

 

A utilização do controle químico de forma isolada ainda é uma ferramenta eficaz, porém exige atenção. Herbicidas pré-emergentes, como o diclosulan, são uma alternativa promissora na redução da infestação de buva. Já para os herbicidas pós emergentes, a utilização de produtos de diferentes mecanismos de ação de forma associada ou em sucessão, proporcionam ótimos resultados. Atualmente, não há relatos confirmados de resistência de buva aos herbicidas auxínicos, tornando-os uma importante ferramenta no manejo dessa planta daninha. Contudo, é importante salientar que o uso isolado desses produtos poderá selecionar genótipos resistentes, inviabilizando mais essa tecnologia.

Estudos científicos têm relatado que a buva pode se comportar como hospedeiro alternativo para pragas, como o percevejo verde-pequeno (Piezodorus guildinii), percevejo-marrom-da-soja (Euschistus heros) e percevejo-asa-preta (Edessa meditabunda), e também de lepidópteros, como a lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis), lagarta falsa-medideira (Chrysodeixis includens) e lagarta-do-cartucho-do-milho (Spodoptera frugiperda). Além destes insetos, produtores e técnicos no ano de 2013 encontraram a lagarta Helicoverpa armigera, em estágio avançado de desenvolvimento, alimentando-se de plantas de buva no estado do Mato Grosso do Sul, durante a fase de preparo para o plantio da soja. A buva ganha importância para essas pragas principalmente nos momentos em que a oferta de alimento é reduzida, ou seja, entressafras e períodos próximos à colheita. Outra espécie que pode utilizar buva como hospedeiro alternativo é o ácaro Brevipalpus phoenicis, vetor da leprose dos citros, que é uma espécie polífaga. Estudos constataram a preferência do ácaro B. phoenicis por se alimentar na base dos tricomas presentes na superfície do caule da planta, servindo, portanto, como hospedeira alternativa, o que pode contribuir para a disseminação do ácaro e, consequentemente, da leprose nos pomares de citros.

O manejo integrado da buva é a ferramenta mais eficaz na redução dos prejuízos causados por essa planta daninha. A utilização em conjunto de práticas culturais e controle químico, buscando a eliminação por completa dessa planta durante o período de desenvolvimento das culturas, na entressafra e em pomares, é imprescindível para evitar perdas diretas de rendimentos causado pela competição, ou indiretos gerados por pragas alojadas oportunamente na buva. Por fim, é fundamental o uso racional de herbicidas, principalmente aqueles que ainda desempenham controle satisfatório sobre a buva, de modo a evitar a seleção de plantas resistentes e prolongar a utilização desta ferramenta de manejo.

Fonte: Mais Soja

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