O agricultor já está acostumado. A todo início de safra, diversos órgãos e consultorias privadas estimam qual será o volume produzido pelas lavouras brasileiras. Ao longo do ciclo – da semeadura à colheita –, esses dados são atualizados, com base, por exemplo, na evolução do plantio, no nível de desenvolvimento das plantas e na eventual ocorrência de sinistros climáticos, que podem causar impacto na produtividade. Essas estimativas, é claro, não são feitas ao acaso: se consolidam por meio de critérios técnicos e de dados coletados a partir de uma rede de atores do setor agrícola. Por que, então, os números variam significativamente de um órgão para outro? Simples: por diferenças na metodologia usada pelas entidades responsáveis por cada levantamento.
Dentre as instituições públicas, fazem a estimativa de safra a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e o Instituto Nacional de Geografia e Estatísticas (IBGE). Nos diversos Estados, cada um tem uma entidade, que faz o levantamento em âmbito estadual – no caso do Paraná, o responsável é o Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento (Seab). Em nível mundial, os principais dados são estimados e divulgados pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda, na sigla em inglês).
“As diferenças decorrem da metodologia de cada órgão. Essa diferença faz com que os números sejam mais divergentes antes do início da safra, mas a tendência é que eles vão se afinando e fiquem muito próximos, senão iguais, no fim do ciclo. Essa diferença de metodologia se dá em razão dos objetivos de cada órgão. O IBGE, por exemplo, usa os dados no cálculo do PIB [Produto Interno Bruto], enquanto a Conab tem os olhos mais na produção agrícola, mesmo”, explica a analista de mercado Daniele Siqueira, da AgRural.
Enquanto o IBGE faz suas projeções para o ano civil, a Conab elabora sua estimativa para o ano-safra – de julho de um ano até junho do ano seguinte. Com a definição das datas de previsão de início de plantio, a Companhia se volta as perspectivas climatológicas para o período. Os técnicos também levam em consideração o “pacote tecnológico” que os produtores de cada região têm usado nos anos anteriores – o que tem relação direta com a produtividade das áreas.
“Como nós também fazemos o levantamento dos custos de produção, temos o acompanhamento de o que o produtor tem usado: o tipo de tecnologia de sementes, a adubação… Com isso, conseguimos projetar a produtividade, com base nesse pacote tecnológico”, diz o superintendente de Informações do Agronegócio da Conab, Cleverton Santana.
Em seguida, a partir de sua rede em todos os Estados – composta por mais de mil informantes –, a Conab faz o levantamento da intenção de plantio, verificando se haverá oscilação da área plantada por cultura. No caso do Paraná, além de técnicos da própria entidade, os informantes são, principalmente, o Deral e cooperativas agrícolas. Com base nesses quatro pontos – perspectivas climáticas, pacote tecnológico, área plantada e médias de produção de anos anteriores –, a Conab faz seu levantamento inicial, a partir de um modelo estatístico adaptável à realidade de cada Estado que remonta a quatro décadas.
“O Deral é uma instituição de excelência, que trabalha com dados muito confiáveis. Seria muito bom se tivéssemos um órgão do nível do Deral em cada Estado”, comenta Santana.
Paraná
No Paraná, o Deral também parte da estimativa de área plantada de cada um dos 399 municípios e das respectivas médias de produtividade. Para fazer esse levantamento, os técnicos coletam informações diretamente nos municípios e regionais, ouvindo fontes de cooperativas, sindicatos rurais e prefeituras. Uma das diferenças é que o Deral leva em conta a produtividade potencial – ou seja, a média entre as faixas de produção máximas e mínimas esperada para cada município. A Conab, por sua vez, trabalha com a produtividade normal, em um modelo estatístico que já prevê perdas em razão de possíveis eventos climáticos. Essa é a explicação para os números iniciais do Deral serem mais otimistas.
“Conforme há a ocorrência de fatores climáticos e a safra vai evoluindo, vai mudando a nossa produtividade esperada e vamos ajustando a produtividade obtida. Essa revisão vai sendo feita constantemente”, aponta o coordenador da Divisão de Estatísticas do Deral, Carlos Hugo Godinho.
Atualização
Como se vê, o trabalho não se encerra no levantamento inicial, mas passa por acompanhamentos e atualizações constantes, com checagem em campo e com a consulta aos setores técnico e produtivo de cada município das 23 regiões do Paraná. “Essas revisões de atualização são feitas semanal e mensalmente. O IBGE utiliza os nossos dados, com a nossa metodologia”, informa Godinho.
A Conab, além de se valer das atualizações promovidas pelo Deral, também faz outros tipos de acompanhamento agrometeorológico: um deles, em que os analistas e técnicos acompanham, semana a semana, o índice de precipitação, as previsões do tempo e as condições de umidade do solo, prevendo eventuais impactos à lavoura; outro, em que a técnicos fazem o acompanhamento a partir de dados repassados a cada 16 dias e captados por um satélite da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos.
“Por fim, analisamos a dispersão de dados e afinamos as estimativas médias, de modo a ter uma média amostral mais homogênea. É um levantamento que já fazemos há 40 anos e que, portanto, nos dá um banco de dados bem estruturado”, aponta Santana. No mundo Um dos levantamentos em âmbito mundial mais confiáveis e mais usados pelo mercado é o elaborado pelo Usda. O departamento estadunidense também faz suas projeções com base em dados levantados por órgãos de cada país, refinados por entrevistas com fontes do setor agrícola. “São os levantamentos mais confiáveis que temos em nível mundial e que são atualizados constantemente. A FAO [Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura] demora anos para atualizar sua base de dados. Então, os do USDA acabam sendo os mais confiáveis”, explica Daniele, da AgRural.
Metodologia da Conab em sete passos
Veja o que a Companhia Nacional de Abastecimento leva em conta para fazer sua estimativa de safra
1º – Previsão: Com a definição do calendário de plantio, técnicos se voltam às perspectivas climatológicas para o período, analisando qual o impacto as condições devem legar à safra;
2º – Pacote tecnológico: Com base em informações do levantamento de custos de produção, técnicos estimam qual o impacto que o pacote tecnológico – como qualidade de sementes e de adubação – deve provocar nas lavouras de cada região, em termos de produtividade;
3º – Intenção de plantio: Técnicos fazem uma projeção da área a ser plantada em cada região, com base na intenção de plantio manifestada por produtores de cada localidade;
4º – Médias históricas: Modelo cruza as informações obtidas nos três itens anteriores com as médias de produção e de produtividade de cada estado, estabelecendo a primeira estimativa para a safra;
5º – Acompanhamento agrometeorológico: Técnicos fazem o acompanhamento constante das culturas, de duas formas: a partir da análise de níveis de chuva e de umidade do solo; e de dados das lavouras, captados por um satélite. Com essas informações, companhia estima eventuais impactos nas estimativas;
6º – Rede de informantes: Companhia continua acompanhando o monitoramento feito por órgãos estaduais – como o Deral, no Paraná –, que leva em conta entrevistas com cooperativas, sindicatos rurais e prefeituras, além de levantamentos em campo;
7º – Análise de dispersão: Por fim, periodicamente, a companhia faz a análise de dispersão dos dados, afinando as estimativas médias, de modo a ter uma amostra mais homogênea.
Fonte: Mais Soja - Disponível em Portal do Sistema FAEP
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