10
nov
2010
Comercialização é o principal gargalo do trigo brasileiro

 

Produtores sofrem com a concorrência externa e com a Política de Garantia de Preço Mínimo pouco atuante

Mesmo sendo um importante produto para a segurança alimentar nacional, o trigo é hoje uma cultura pouco atrativa para o agricultor brasileiro. Ainda que amparados pela Lei 8096/90, que visa apoiar a produção nacional, os triticultores sofrem com a concorrência externa, decorrente da política de livre mercado adotada pelo Brasil, e com uma Garantia de Preço Mínimo pouco atuante.

“Na prática, a regulamentação da lei não aconteceu e o trigo passou a ser uma cultura subordinada, exclusivamente, às leis de mercado, ao lobby das indústrias moageiras e totalmente dependente do mercado externo”, afirma o deputado federal Moacir Micheletto (PMDB/PR). Gargalos logísticos, tributários e distorções existentes no mercado externo, como subsídios de países produtores, estão entre os fatores que prejudicam a competitividade do trigo nacional. Micheletto cita a valorização do real e a infraestrutura de moagem, que na sua maior parte, está concentrada próxima aos portos e está mais interessada em trabalhar com trigo importado, já que muitas delas pertencem a grupos multinacionais. Além disso, o frete de cabotagem é, segundo o deputado, caro e ineficiente, devido à reserva de mercado aos navios de bandeira brasileira, criada pela Lei dos Portos em 1993. Os altos custos com combustíveis, insumos e transporte rodoviário também prejudicam a produção brasileira. De acordo
  com o deputado, a competição tributária na esfera estadual, no caso do ICMS, também estimula o uso do cereal estrangeiro, pelo fato de gerar maior arrecadação para os estados consumidores.

Por essa razões, a maior dificuldade enfrentada pelo triticultor atualmente é a comercialização do produto. Para o chefe geral da Embrapa Trigo, Sérgio Roberto Dotto, isso também se deve a inexistência de um trigo com qualidade segregada, ou seja, padronizado dentro de seus lotes. “Existem vários caminhos para se chegar a uma maior liquidez na comercialização”, aponta Dotto. Regionalizar as variedades para que se crie um padrão na qualidade do trigo brasileiro, como o que ocorre hoje com o vinho, com as chamadas “denominações de origem”, é uma dessas saídas. Outra maneira é o sistema de compra garantida, onde um determinado moinho ou indústria solicita uma variedade de acordo com sua finalidade, e o produtor fornece variedades específicas para tal. Já o presidente da Coopatrigo de São Luiz Gonzaga (RS), Paulo Pires, defende uma regulamentação pela qual todo o moinho que importa trigo devesse comprar uma parte do produto nacional, da mesma forma como ocorre hoje na comercializ
 ação de biodiesel para as distribuidoras brasileiras de combustíveis.

Atualmente, nem o preço mínimo é garantido pelo governo e os novos instrumentos de apoio a comercialização, como PEP (Prêmio de Escoamento de Produto) e os Contratos Privados de Opção de Venda (PROP), não alavancam a comercialização da produção interna. “Nas duas últimas safras, o preço recebido pelo agricultor ficou abaixo do preço mínimo”, afirma Micheletto. Para o deputado, o preço mínimo vigente é inadequado. Já para Paulo Pires, presidente da Coopatrigo, “se o preço mínimo fosse cumprido no momento certo, obedecendo à classificação do trigo pelo Ministério da Agricultura, estaríamos contentes”. Ele lembra que “pela primeira vez na historia houve redução do preço mínimo, sendo que não houve redução no custo da produção”. Em setembro de 2009, o valor mínimo da saca de 60 kg estava em R$ 25,46 no Paraná e em R$ 21,92 no Rio Grande do Sul. Já em setembro desse ano, o preço do produto baixou para R$ 25,08 no Paraná e para R$ 21,40 no Rio Grande do Sul (CONAB).

No final de junho passado, o governo federal reduziu o preço mínimo da nova safra de trigo em 10% em relação ao da safra passada. “Vale observar que a esta queda do preço mínimo soma-se em torno de 5% se incorporar a perda relativa à inflação dos 12 meses da safra. Portanto, a perda real do preço mínimo da atual safra, em relação à safra anterior, atingiu cerca de 15% e não cobre os custos de produção. Isso sem falar na falta de recursos para a comercialização da safra passada”, completa Moacir Micheletto.

De acordo com o deputado, a política anual de safra, que está mais estruturada para conceder crédito rural, deveria priorizar a renda e o emprego na agricultura no período de inverno, por meio de salvaguardas contra a concorrência predatória e garantia de preço mínimo, que refletiria na incorporação de tecnologia e aumento da produção e da produtividade. No inverno, ficam ociosas expressivas áreas, mão-de-obra e equipamentos agrícolas. “Mas, infelizmente, por decisão política, o país prefere importar e gerar emprego no exterior”, critica Micheletto. Para ele, o Brasil deveria ter como meta garantir que, no mínimo, 60% da demanda interna de trigo fosse atendida com produção própria. Para isso, defende a proibição de entrada de trigo importado no Brasil, na época de colheita e comercialização de safra nacional e também a manutenção de alíquotas da Tarifa Externa Comum (TEC) do trigo para países não membros do Mercosul em 35%.

Para Sérgio Roberto Dotto, da Embrapa Trigo, se houver uma determinação governamental, o Brasil pode se tornar autossuficiente na produção de trigo. “Porém, são necessários vários mecanismos que protejam a produção nacional, que será garantida pelos triticultores”, afirma.

“Entretanto, parece não existir, atualmente, interesse político por parte do governo para que isto aconteça”, critica Micheletto, para quem a triticultura nacional está recebendo pouco apoio governamental. Conforme o deputado, na safra 2010/11, segundo dados da CONAB, foram plantados cerca de 2,1 milhões de hectares, quantidade muito aquém da área disponível, e a produção estimada para a safra é de 5,4 milhões de toneladas, volume que atende em torno de 53% do consumo interno. Estima-se que o plantio de trigo nesta safra envolva cerca de 150 mil propriedades e 154 mil empregos diretos.

Apesar do trigo brasileiro da nova safra apresentar boa qualidade, o triticultor não foi beneficiado com a valorização do cereal no mercado internacional. A falta de interesse das indústrias moageiras pela compra do trigo nacional dificultou a reação dos preços no mercado interno. Para Micheletto, falta ao triticultor brasileiro uma política de sustentação de renda. Os atuais excedentes de produção, que superam a 2,5 milhões de toneladas, encontram-se sem perspectiva de comercialização.

“A cultura do trigo necessita de uma atenção especial que minimize a frágil situação perante a concorrência externa predatória para que o Brasil possa reduzir a dependência externa a que está submetido, gerando mais renda e emprego durante o inverno”, defende Moacir Micheletto.

Com a missão de ordenar o trabalho de pesquisa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a Embrapa desempenha um importante papel nas unidades de Passo Fundo (RS), Londrina (PR), Dourados (MS) e Brasília (DF). Em cada uma dessas unidades, novas tecnologias são desenvolvidas nos segmentos de fitopatologia, entomologia e novas variedades para a cultura do trigo. Conforme o chefe geral da Embrapa Trigo, 45% de toda a área plantada no Paraná é proveniente de variedades desenvolvidas pela Empresa. Já no cerrado, este percentual chega a 90%. “Também realizamos um suporte aos produtores através de boletins com informações técnicas, e com o trabalho de campo, como o que ocorreu este ano quando técnicos identificaram a presença da bacteriose em lavouras no RS”, exemplifica Sérgio Roberto Dotto.

Valorizando o diálogo entre os setores, o avanço científico e o uso das novas tecnologias de produção, o Agrolink acredita no desenvolvimento da triticultura nacional e parabeniza todos os produtores brasileiros pelo Dia do Trigo, comemorado em 10 de novembro.

Fonte: Agrolink

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