Bruno Cirillo
SÃO PAULO - A crise de oferta pela qual passa o trigo - valorizado, portanto, no mercado global - gera um efeito positivo no Brasil: os produtores estão otimistas quanto à garantia de venda e preço da matéria-prima do pão.
Contudo, terão de esperar pelo final do ano para obter os rendimentos da safra. Pois antes do período de colheita, que se concentra em setembro, o cereal passará ao largo das negociações.
"É impossível prever a qualidade do trigo", explica o triticultor Ivo Arnt, de Tibaji (PR). "Pela falta de produto, a comercialização vai ser boa, mas não dá para antecipá-la", diz.
O especialista Carlos Riede, do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), observa que a falta de mecanismos capazes de identificar a procedência do trigo durante o plantio é um problema que afeta a comercialização do cereal - excluído, no Brasil, do mercado futuro, que oferece liquidez.
"Se houvesse conhecimento da variedade plantada e da região em que se produz - tudo isso é possível de mapear -, a comercialização seria facilitada", analisa Riede. O pesquisador acrescenta que a análise, por ser pós-colheita, cabe aos moinhos.
Para garantir venda, Arnt estabelece contratos de intenção junto a essas agroindústrias. Garante a comercialização, mas não o preço, que só é decidido após análise, com o cereal já colhido.
"O trigo sempre foi um desestímulo", afirma o triticultor, que representa os colegas paranaenses na Câmara Setorial das Culturas de Inverno, no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
"Mas, neste ano, com os preços internacionais e a posição dos moinhos, toda a oferta será vendida", pondera o representante.
Arnt ainda faz uma comparação: 50% da soja e 20% do milho previstos para 2013 já estão comercializados, enquanto 0% do trigo esperado para este ano se encontra no mercado futuro.
O gerente-comercial da empresa paranaense Semegrãos, Edgar Martins, diz que parte da soja e do milho plantados para o ano que vem já tem contratos garantidos. E o trigo deve perder 70% da área para que se expanda o milharal.
"Reduziu-se muito o volume e a qualidade do trigo nesta safra. Seria impossível antecipar a comercialização", diz Martins, que negocia contratos de venda por meio de corretoras financeiras.
Mercado global
A semana teve início com a notícia de que o clima seco deve prejudicar em 20% a 30% a produtividade dos grãos na regiões da Sibéria e dos Urais, na Rússia. "O mercado ainda não reagiu", afirma o analista Bruno Perottoni, da corretora Terra Investimentos.
Ontem, o trigo chegou ao fim do dia valendo US$ 8,58, com perda de 2%, na Bolsa de Chicago. A baixa, apesar de ser a terceira em uma semana, é considerada apenas um "ajuste" pelos especialistas - considerando que as cotações do cereal encontram-se em patamares inéditos.
Perottoni avalia que "se a notícia da Rússia se confirmar, o mercado deve reagir com nova alta de preços". O país é, historicamente, o terceiro maior exportador de trigo, e deve reduzir a safra a 45,5 milhões de toneladas em 2012. A colheita do ano passado havia rendido 56 milhões de toneladas.
No Brasil, o maior estado triticultor, o Paraná, também tende a amargar perdas de volume neste ano. Os produtores devem colher 1,6 milhão de toneladas, o menor resultado em trinta anos, segundo Arnt.
"Entre fevereiro e março, precisamos estar com todos os armazéns vazios para a soja e o milho."