Atualmente, o mercado é atendido por sementes das plataformas tecnológicas convencionais, RR e Ipro – cada qual com suas características. Além disso, estão em desenvolvimento a Enlist/Conkesta e a Extend Ipro. Mas quais os critérios para escolher com qual trabalhar?
Engenheiro-agrônomo Daniel Glat, integrante efetivo do Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) e mestre em Tecnologia de Sementes
O contínuo desenvolvimento do melhoramento genético, da biologia molecular, das técnicas de produção e dos equipamentos de tratamento vem dando cada vez mais relevância e protagonismo para as sementes nas principais culturas. Na soja, isso é particularmente verdadeiro. Hoje, a semente do grão é a grande estrela dos insumos, e a escolha das variedades acaba definindo muitas das práticas de manejo e uso de outros insumos.
Uma variedade moderna de soja é a combinação do germoplasma com as biotecnologias embutidas nele. Germoplasma, que é único para cada variedade, é o conjunto de genes que definem as características da variedade – por exemplo, ciclo, porte, hábito de crescimento, cor de flor, potencial produtivo, tolerância a doenças e nematoides etc. Já as biotecnologias embutidas são iguais para todas as variedades, ou seja, todas as variedades RR são resistentes ao glifosato e todas as variedades Intacta são resistentes ao glifosato e à maioria das lagartas.
A essas variedades modernas geralmente são acrescidos produtos biológicos para fixação de nitrogênio ou proteção das plantas, além de produtos químicos para proteção ou estimulação das plantas. Esses tratamentos de sementes podem ser feitos na fazenda, os tratamentos on farm, ou podem sair tratados de fábrica, os conhecidos TSI Tratamento de Sementes Industrial (TSI).
Assim, a escolha da variedade a ser plantada passa pela análise do germoplasma, das biotecnologias embutidas, dos tratamentos de sementes e, obviamente, do fornecedor dessa semente.
A escolha da plataforma
A primeira decisão que o produtor geralmente toma é com quais plataformas tecnológicas vai trabalhar. Hoje, as três opções são convencionais, RR e Ipro. No futuro próximo, vão chegar ao mercado mais duas plataformas de biotecnologia para soja: Enlist/Conkesta, da Corteva e MSgenetics, que trará resistência ao glifosato, ao glufosinato de amônia e ao 2,4D, além de uma reforçada resistência a lagartas (dois genes); e a plataforma Extend Ipro, da Bayer, com resistência aos herbicidas glifosato e dicamba, além de reforçada resistência a lagartas (três genes).
As variedades Intacta Ipro são as mais usadas hoje no Brasil, representando por volta de 75% do mercado. Essa preferência vem da facilidade e da praticidade no controle das lagartas e do uso de glifosato, e também devido ao grande leque de variedades de alto potencial produtivo ofertadas nessa plataforma. Os plantios de variedades Intacta devem ser sempre acompanhados de 20% de variedades RR para prática do refúgio. As variedades RR ocupam, aproximadamente, 22% a 23% do mercado e são usadas ou como refúgio das Intactas, ou em áreas que o produtor não sente muita pressão das lagartas, ou, ainda, pelo desempenho da variedade. Como a patente da tecnologia RR já expirou, o produtor não paga royalties de tecnologia sobre essas variedades, nem na semente, nem na moega. As variedades convencionais ocupam, hoje, cerca de 2% a 3% do mercado, mas podem ser interessantes, dependendo da diferenciação de preços local para soja não OGM, ou pelo desempenho da variedade.
Enquanto a oferta de RR e convencionais é relativamente limitada, na plataforma Intacta existe uma grande oferta de variedades que permite ao produtor fazer escolhas bem detalhadas sobre o germoplasma.
Ensaios para saber a mais indicada
A melhor fonte de informação sobre uma variedade é o desempenho dela em cada propriedade. Apesar de trabalhoso, fazer ensaios e testes de variedades em próprias áreas é uma excelente forma de se conhecer novos materiais. Também são sempre muito úteis informações de bons produtores da região, áreas de ensaios comparativos de terceiros, resultados das consultorias idôneas da região, além, é claro, das informações das empresas de sementes. Em termos de número de variedade a plantar, obviamente, depende da área plantada, mas, em média, um produtor de mil hectares tende a plantar de três a cinco variedades; uma ou duas “carros-chefe”, uma ou duas em crescimento ou declínio e uma ou duas em pequenos volumes iniciais.
Na escolha das variedades a serem plantadas, a principal característica que o produtor busca é produtividade. Aqui, vale lembrar a equação da produtividade de soja: Produtividade (kg/ha) = número de plantas/ha x número médio de vagens por planta x média de grãos por vagem x peso do grão – PMS. Importante ressaltar que o número de grãos por planta e o peso médio do grão tendem a ser antagônicos. Existem variedades altamente produtivas de grande “carga” de vagens, mas com PMS mais baixo, geralmente plantadas em populações mais baixas. E existem variedades de menor número de vagens e grãos por planta, mas com alto PMS, e que, plantadas em populações mais altas, também entregam altas produtividades. Enquanto as primeiras são as que chamam muita atenção visualmente, as segundas são aquelas que “surpreendem positivamente na colheita”. Cada produtor deve avaliar que tipo de variedade entrega com mais consistência em suas condições.
Importante observar, ainda, que existem variedades de altíssimos picos de produtividade, mas mais demandantes em termos de solo e clima. São as ditas variedades “exigentes”. Outras variedades, mesmo com picos de produtividade menores, conseguem manter um bom nível de produtividade pelas diferentes condições, são as variedades ditas “estáveis”. Há, ainda, as variedades que conseguem sustentar certa produtividade mesmo em condições inóspitas, as chamadas variedades “rústicas”.
Variedades de ciclos diferentes
A escolha de variedades de ciclos diferentes para serem plantadas por ordem de ciclo também é uma boa prática para mitigar os riscos climáticos e escalonar a colheita. Com a safrinha e o surgimento da ferrugem, a preferência por materiais mais precoces é cada vez maior. Algumas das variedades mais plantadas do Brasil têm ciclo de 105- 125 dias. Para áreas de algodão safrinha já se deseja variedades com menos de 100 dias. Para as variedades precoces, a tolerância à chuva na colheita é uma característica bastante desejada.
Outros dois critérios importantíssimos na escolha das variedades são as tolerâncias às principais doenças da região e para inúmeras raças de nematoides que atacam a cultura. Felizmente, existem excelentes variedades Intacta resistentes ou tolerantes às diversas raças de nematoide do cisto e das galhas. Para o Pratylenchus, não existe ainda resistência genética, mas variedades de crescimento vigoroso de raízes que acabam se saindo melhor nessas condições.
Escolhidas as variedades, o produtor ainda precisa definir como vai adicionar os biológicos e os tratamentos de sementes. Está mais em uso a aplicação de produtos biológicos no sulco de plantio – rizobium, azospirilum, trichoderma e outros –, evitando, assim, misturar com os químicos do tratamento. O tratamento da semente on farm tende a ser mais irregular, além de expor os funcionários mais diretamente aos produtos. O tratamento industrial além de mais uniforme, tem uma grande vantagem de não ter que mexer com a semente na fazenda antes do plantio, quando o TSI vem com inoculante longa vida ou quando a aplicação dos biológicos se faz no sulco de plantio. Da forma que o produtor escolher, o importante é não deixar de adicionar os produtos biológicos e sempre plantar sementes tratadas com fungicidas, inseticidas e enraizadores/estimuladores fisiológicos.
O fornecedor de sementes
Por último, mas não menos importante, é a escolha do fornecedor de sementes. Enquanto as variedades vendidas só verticalizadas têm apenas uma empresa fornecedora, as de licenciamento restrito ou limitados têm poucos fornecedores e as de amplo licenciamento têm muitos fornecedores. O importante é escolher um fornecedor idôneo, de confiança, que, além de fornecer sementes de qualidade nos volumes e prazos acordados, forneça boas orientações técnicas e esteja sempre à disposição em caso de algum problema com lotes entregues.
Enfim, o processo de escolha das variedades de soja a plantar é complexo, mas de grande importância para o futuro da lavoura. Afinal, desde tempos imemoriais, as sementes trazem em si a promessa de colheita farta, que os demais insumos e práticas de manejo usadas buscam proteger e maximizar.
Fonte: A Granja
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